Pensava que os mais recentes acontecimentos iriam travar os cínicos, mas a julgar pelo que se vai lendo, enganei-me. Tinha boas razões para ter essa convicção. Afinal de contas, falo de gente que passou meses a anunciar a morte da selecção nacional, depois da derrota com a Dinamarca, depois do empate com a Albânia, depois do empate com a Suécia (com o mítico "Adeus África"), que não acreditava na ida ao playoff (íamos ser "o pior segundo"), que não acreditava na vitória contra a Bósnia. Que não acreditava, até ter de acreditar, porque Portugal apurou-se mesmo.
Refeitos da desilusão, os cínicos regressaram em força. Que o Mundial ia ser uma vergonha. Que o Drogba mete uns cinco ao Eduardo. Que saía goleada contra o Brasil. Que caminhávamos para mais um "2002". Pior, que ia ser uma repetição de Saltillo! Ao primeiro jogo (natural empate com um adversário directo), readquiriram força: "perdemos margem de manobra", eliminação à vista, nem um milagre nos salva. "Estou a cair para o lado daqueles que já pouco ou nada acreditam nas nossas possibilidades", escreveu o campeão do cinismo blogosférico português (num post de antologia). Dias depois, 7-0 à Coreia. Chatice. Mas contra o Brasil, ai contra o Brasil, abandonem os barcos, protejam mulheres e crianças, que vai ser um descalabro! Olha, deu empate...
E agora, que Portugal se apurou, sem derrotas, sem golos sofridos, cumprindo plenamente o mínimo exigível? Agora, claro, malha-se no miserável do Queiroz que "nos pôs a jogar à defesa" e que por isso nos levou a encontrar a poderosa Espanha. Repare-se na incoerência do argumento: tínhamos de ter arriscado, para ganhar ao Brasil e assim evitar a Espanha. É como dizer que para aguentarmos água a ferver o melhor é dormirmos numa lareira acesa...
Deixemo-nos de brincadeiras. Primeiro: Portugal não sabia quem ganharia o grupo H, pelo que não era possível "escolher" o adversário. Segundo: actuávamos contra uma das melhores equipas do mundo (tão favorita quanto a Espanha, caramba!), que há um ano e meio nos ganhou 6-2. Terceiro: nestas circunstâncias, Portugal adoptou o único plano de jogo lógico na sua situação - apostar na contenção, manter o Brasil longe da nossa baliza, jogar com o resultado do outro encontro e garantir o apuramento. Objectivo bem traçado e bem cumprido. O que diriam os cínicos se Portugal arriscasse, perdesse por 3 ou 4 e a Costa do Marfim se tivesse apurado num forcing final? Nem quero imaginar.
Ah, e tal, mas podíamos ter arriscado mais porque a Costa do Marfim só estava a ganhar por 2-0. Mas foi isso que aconteceu! Depois de uma primeira parte ultra-defensiva, Queiroz lançou Simão, Portugal subiu linhas, dominou o jogo durante 15-20 minutos e teve uma ocasião flagrante (Meireles) para marcar. Falhou e depois não foi capaz de voltar a acelerar, mas repito: cumpriu plenamente o plano estratégico e o objectivo traçado. Ninguém está a dizer que foi perfeito (muitos passes falhados, erros de casting de Danny e Duda, mau jogo de Pepe, Ronaldo com remates insanos, etc.). Mas foi claramente suficiente. Para mal dos cínicos.
E agora, com a Espanha? Os cínicos, naturalmente, anunciam desde já um massacre de proporções épicas. Pode acontecer? Pode. A Espanha é a melhor equipa europeia da actualidade e tem uma selecção fortíssima. E os cínicos têm do seu lado a vantagem de que, se falham o prognóstico, "não conta", se acertam, dizem "estão a ver" (lembra a história do cínico que passava a vida a dizer aos amigos que estava prestes a morrer, embora fosse sobrevivendo ano após ano; quando, por fim, morreu, aos 105 anos, lia-se na sua lápide "eu não dizia?"). Em todo o caso, se isso acontecer - se formos goleados - serei o primeiro a escrever aqui: para mal de muita gente, Portugal já cumpriu os seus objectivos fundamentais neste Mundial. No entretanto, vou lanchar a Aljubarrota. Just in case.
katanec
Um comentário:
Ora bem...temos aqui um blog de cara lavada, é sempre positivo.
Olha o Queirós não me impressiona absolutamente nada, não me inspira absolutamente nada, e muitas vezes deixa-me de queixo caído com as opções que toma.
Evidentemente uma pessoa pode errar, às vezes deve errar, mas também deve ser muito exigente e acima de tudo responsável quando o cargo que ocupa não é monetariamente subestimado, e principalmente quando profissionalmente deveria estar preparado para tal.
Critico, não critico ferozmente até porque os meus conhecimentos de futebol são muito básicos e o que nós vemos é resultado de um trabalho de equipa, e os elementos que estão em falta não são constantes. Concordo que existe demasiada crítica fácil, e comentário de conveniência, veja-se os comentários ao jogo Argentina-México, foi realmente alarmante.
As pessoas pecam pelo exagero, quando se perde e quando se ganha, mas creio que os jogadores e treinador ultrapassam isso por diversos motivos (porém não pretendo estender-me).
Apesar de tudo, e mais do que qualquer vitória, espero que hoje o jogo traga espectáculo e brinde o futebol, como dizia a repórter da TVI 'que os jogadores tratem muito bem a bola' xD e que suplante o jogo que decidirá o adversário do vencedor do Espanha/Portugal.
Hasta!
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